A paz: bandeira do Ano-Novo
Entra ano, sai ano. O ser humano volta a falar e a sonhar com a paz. Desejo irrefreável. E acorda tanto mais vigoroso quanto mais guerra se vê no mundo violento de hoje. As pombas voam serenas a apontar para o horizonte de paz enquanto os mísseis assassinos cruzam os ares em busca de morte. Dois símbolos opostos: a pomba e o míssil explosivo.
Com a queda do socialismo real, reina solitário o império americano e não encontra nenhum adversário à altura para provocá-lo a alguma guerra mundial. A China ainda dorme, acumulando forças.
Os riscos de ampliar qualquer guerra assombram de tal maneira o Ocidente que ele recua diante de tal abismo. Se as armas hoje conhecidas amedrontam horrivelmente: que diremos de novas engenhocas mortíferas que a satânica inteligência humana se põe a inventar? Nada pára o avanço tecnológico.
As páginas dos jornais pingam sangue de tantos crimes cruéis que se cometem cada dia.
Vive-se sob o medo. O 11 de setembro injetou fundo na consciência temor permanente, subliminar, invasor. Cada viagem internacional ensaia ataque e contra-ataque. Quem chega de outro continente à Europa ou aos EUA traz a pecha de inimigo potencial.
O homem se porta como lobo diante de outro homem. Triste humanidade rica do Ocidente! Locupletou-se de bens e perdeu a paz de dentro e de fora. E longe dos olhos, trava-se a maior guerra. A da informação, a da microeletrônica, a do laser. A toda velocidade, operam computadores conectados a bancos de dados quase infinitos na busca de criminosos, suspeitos, potenciais guerrilheiros. E do outro lado, a mesma batalha do engano, do ludíbrio, da simulação. Ambos os adversários caminham a passo rápido, buscando um superar o outro na espera da vitória definitiva, que nunca chegará. Porque os corações em guerra açulam as mentes e essas criam infinitas possibilidades de ataque e defesa.
No interior da cada cidade, até mesmo naquelas que até pouco gozavam da tranqüilidade rural do mugir das vacas e do ranger dos carros-de-boi, a violência dos assaltos trava a pior das guerras. Não vem de algum estranho religioso, nem étnico, nem ideológico. Esses se identificam com certa facilidade. Qualquer cidadão que anda com você no ônibus, que lhe segue os passos na rua, que passa de moto a seu lado, que encosta em seu carro com outro carro, pode ser um assaltante de mão armada, ameaçando-lhe levar os bens e a vida.
Fala a mesma língua, batizou-se na igreja, tem filhos na mesma escola, e, de repente, metido na droga, desiludido dos salários baixos, arrebanhado por outros comparsas criminosos, põe-se no caminho do crime organizado.
A sua vida não vale. A do outro também não. E por que viver? Mata-se e morre-se por nada. Eis a pior guerra em que estamos metidos. Quando virá a paz a esses corações? Por onde ela virá? Está aí o grande desafio!
O ano começa. Em face do quadro da violência, cabe-nos semear a paz. Mas que significa concretamente? Como gerar em torno de nós clima de tranqüilidade? Na nossa pequenez não tocamos nem de longe as causas estruturais maiores que se situam na indústria armamentista, na luta econômica pelo petróleo, na disputa pelo tráfico de drogas, na ganância do capital financeiro, no crescimento dos grupos de corsários e piratas físicos e eletrônicos, na inconsciência criminosa dos povos ricos em face da miséria do 3º e 4º Mundos. Possuímos, no entanto, a força incontida do amor e do cuidado. Cabe a cada um de nós lançar raio luminoso de esperança e de acolhida aos necessitados que nos roçam cada dia.
A experiência nos ensina como pessoas dotadas do carisma do cuidado transformam o meio em que vivem. Multipliquemos esse toques de atenção em casa, no trabalho, no lazer, nos encontros fortuitos diários. Promovamos especialmente três tipos de atividades que possuem o magnetismo da paz: a arte, o jogo e a religião. A arte humaniza pelo som, pelo visual e pela representação. O jogo diverte quando desprovido da comercialização e exploração competitiva. E a religião tranqüiliza os espíritos, ao pô-los em conta))to com a serenidade do Mistério, da Transcendência.
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